Termina por ser você

August 20, 2011

Eu esperava que fosse você ...

e eu que ainda espero a hora
na qual eu consiga iniciar
a falar da pessoa certa
no verso certo

e eu que ainda consigo espiar
com os olhos espichados
enfiados em mim mesmo
como Mário de Sá Carneiro a chorar

ainda consigo ver no outro
a espera da hora
a fala da pessoa
o longo dos olhos
o em si mesmo ensimesmar-se

e eu que ainda espero
esse poema iniciar
pelas suas palavras
pelo seu longo olhar

por você e não por mim
eu espero
eu espero para ver
esse poema
iniciar.

(S.Alves)


O medo lembra

June 15, 2011

“ei, há um perigo, e há a insegurança, meu senhor

não, não há perigo, a insegurança é tudo!”

(Arnaldo Baptista)

Fotografia da máscara mortuária de Machado de Assis

O medo lembra,
Antes de mais nada,
Que somos iguais.

Malograda toda diferença,
destilando gota a gota o ego
— cada uma das tristes conseqüências —
habitamos uma igualdade de fantasmas.

O medo tem sido sempre
Imagens que forjam o igual no diferente

Qualquer coisa no lusco-fusco
Que transita entre a noite e eu
O medo tem sede de gente
E quase gente tem sido sempre.
( Sandro Alves )


Lendas vivas de Brasília!

June 20, 2010

Eu tenho um pequeno arquivo de lendas vivas de Brasília. Uma parte delas nem sei se existiram, outra eu conheci. Era uma outra Brasília, não outra como a do sítio da fotógrafa Uscha Velasco, não no sentido que ela dá à expressão “outra” referida à Brasília. Eram outros tempos, outros dias. E a história e a memória das gentes presume ter resgistros e lembranças desse tempo. Mas ele foi obscuro e rico. Somente eu, com minha ontologia a partir dos quase mitos, posso contar a quase história desses tempos.

Uma imagem de Brasília no tempo das lendas vivas. Hoje as lendas, parece, já nascem impregnadas de virus, trojans, estupros, sequestros e outras pragas desse nosso tempo zumbi! Que romântico eu sou!

Adianto que muita gente vai considerar meu arquivo de lendas vivas fraco. Mas é isso! Aguardo contribuições!

Eu queria saber se existiu mesmo a tal da Carla Camburão, aqui em Brasília, lá pelos anos 70. Queria mesmo saber se essa figura foi uma lenda ou não. Contavam que ela dava porrada, inclusive se o sujeito não quisesse namorar com ela. Bem, o povo fala e a conversa de boca em boca é uma das formas criativas mais mirabolantes já conhecidas – e muita usada – pelo ser humano.

Na foto, de frente, com um papagaio no pescoço mordendo a orelha dele, meu amigo Cesa Nelson, que tentava se passar, ai, por um pirata. Mas foi tentando se passar pelo lendário "Cezinha cabeção" que ele machucou mesmo a orelha... olho, o nariz, a boca ...

Agora, o Cebola eu conheci. O Cebola, gordinho com cabelo de piaçaba, tal qual uma cebola, com rugas de maracujá querendo ir prá gaveta, era um freqüentador do Beirute nos anos 80. Nunca mais vi. O Cebola teria namorado a Gal Costa e conhecido a Janes Jopplin. Ou ele ficou mesmo só no terreno nacional? Se bem me lembro ele falava algo como “O lance da Gal foi que ele não tava numas…”. Não me lembro bem. Adoro escrever com amnésia relativa!

A foto saiu de cabeça para baixo. Depois eu corrijo isso. Nela figura, mais uma vez, meu amigo Cesar Nelson; única lenda viva de Brasília que eu registrei, "apreendi" com minha câmera! Ai ele está se passando por punk.

E além da Carla Camburão e do Cebola tinha o tal do Cezinha Cabeção! Esse parece que existiu mesmo. Meu amigo Cesar Nelson (Cesar Antônio), certa feita, lá pelos idos dos anos de 1980, se fez passar pelo tal Cezinha Cabeção. A coisa ficou feia para o lado do Cezar Nelson. “Vamu Nelson, galelra, vamu Nelson! Eu já tô sentido que vai ser mais uma daqueles noites surreais!” Dizia o Cesinha quando o tal do Cezinha cabeção aparecia na área. Agente corria muito mas saímos da adolescência com todos os dentes e poucos olhos roxos.

Quem mais? Quem mais foi lenda viva nessa cidade borboleta? (é, borboleta! Lúcio Costa afirmou que o traçado da cidade foi baseado nas formas de uma borboleta).  Bem, teve o
Eri. Dizem que esse rapaz, amigo de um amigo meu, dirigia-se às moças e dizia: “Prazer, meu nome é Eri, Eribaldo!”. O 007 que se cuidasse!

Brasíia Mítica! Nem Vale do Amanhecer nem caminho para a Chapada dos Veadeiros! A Brasília Mítica está localziada entre sua criação e o fim dos anos 80. Eu sou seu profeta!

O Clevinho (Clebinho) do Guará existiu. E namorou uma lenda. Não me lembro o nome.  Será que foi  a Carla Camburão? Acho que foi. Falecido ele, não tenho com pesquisar. Talvez o Érico Zorba, que nos apresentou – e salvou minha vida quando um amigo do Clevinho lá do gama quis me encher de porrada – possa contar algo sobre essa namorada do Clevinho, que também foi uma lenda, embora tenha existido. Com eu disse, o povo fala, conta. E eu também. Tirando a história que vem adiante, sobre o Jetro, o resto é pura imprecisão da minha parte.

Teve uma dupla, que fez lenda. Um amigo, de quem não posso dizer o nome – auto-intitulava-se punk e fazia suas próprias lendas inventando e distorcendo histórias – e o saudoso Marcelo Chau. Os dois se viam a 200 metros de distância um do outro e pronto! Saião correndo e gritando feito locos e se atracavama. Era porrada comendo solta. Como o meu amigo não era muito de vera e o Marcelo era magrinho e não brigava grandes coisas, creio que houve muito teatro nesses atracamentos. As preliminares indicam o caráter dramático da coisa toda.

Enfim, Cezar Nelson sendo ele mesmo, o melhor ilustrador do jornal "Nossa Voz". Periódico juvenil contestador. O "Nossa Voz" emergiu no seio do Colégio Marista de primeiro grau, em plena ditadura, no ano sagrado-profano de 1981! O Cesar Nelsom é o que está caindo da cadeira! Não sei se fui eu o autor dessa imagem. Sei que não foi a outra fotógrafa do jornal, a Sandra Silveira (é, Sandra Silveira mesmo), pois ela conversa com o Maurício, ao fundo, no rumo do cotovelo esquerdo do Cesar, a nossa direita.

Eu esperava me lembra de mais lendas vivas, mas vou ter que encerrar falando do Jetro, por quem nutro afeição e gratidão!

Teve também o Jetro, mas esse não foi lenda e, para mim, é uma criatura saudosa. O vi pouco antes de sua morte e ele demonstrou ser um ser humano incrível. Me obrigou a levar a sério um pedido de desculpas dele por quase ter me matado. Eu dizia “Que nada, não foi nada”. Ele ficou bravo e disse: “Sandro, eu agora sou temente a Deus (ou sou evangélico, não lembro exatamente o que ele disse) e não é brincadeira o que eu estou dizendo! Naquele dia eu quase matei você e eu preciso do seu perdão, sério, é coisa séria, é grave!” De um frio filho da mãe da espinha! Então eu pensei: “Meu amigo Fernando Antônio tinha razão, ele salvou minha vida ao se colocar entre a faca que o Jetro segurava e eu”. Jesus! Como eu era confiante. Foram anos para entender que eu quase tinha morrido de bobeira. Os detalhes que antecedem o momento da faca não podem ser  narrados aqui, inclusive por respeito à memória do Jetro. E também por respeito à minha panaquice juvenil!

S.Alves!


Novas tiradas sobre os velhos lances; reincidências.

April 1, 2010

Achei natural ser pedido na vida, ter perdido uns bondes, ter bandeado meu ser aos montes. Quem não me quiser que ache outro, outros, outros horizontes!

Acabei não me perdendo por completo dentro de mim, não era um labirinto intrincado. Passei pela minha vida um astro doido a sonhar, e ainda passo. Na ânsia de ultrapassar, sempre repasso. (Eu não fui Mário de Sá Carneiro - Sandro Alves)

Nem me perdi tanto dentro de mim. Porque eu não era um labirinto dos mais intrincados. Passei pela minha vida, um astro doido a sonhar, porque ainda sonho e ainda passo. Na ânsia de ultrapassar, sempre que possível, repasso. (Eu não fui Sá Carneiro - Sandro Alves )

Curto circuito: quando os anos vão chegando a vida não parece mais tão longa: curto circuito: tudo ligado no máximo! Quem não tiver a alma elétrica corre o risco de não entender que a vida é uma deliciosa conversa entre amigos! Não tenho tempo para meias palavras e não economizo no verbo nem na humanidade: intensidade: amizade: intensidade!

Orlando Villas Boas na sacada da Pousada Tropicália em 1987 (circa). Ouro Preto, Minas Gerais. A sacada de nos hospedarmos na Tropicália foi do grande Fernando Sá. Dias incríveis!

Mais um Villas boas foi embora. Orlando, há comoção por aqui, comoção mesmo, para além de votos de solidariedade e dos meus sentimentos pelo falecimento de seu irmão. Quando é que vamos curtir Ouro Preto novamente na pousada Tropicália? Acho que o lugar lá deve sentir nossa falta. Sinto falta de você e do Fernando.

Um dos cemitérios de fundos de igrejas de Ouro Preto. 1987 (Circa). Passando o fantasma de uma professora que lecionava inglês para estrangeiros na Inglaterra; ela era alemã. Rachou o quarto na pousada tropicália comigo, o Orlando e o Fernando. No dia seguinte o Fernando flagrou ela conferindo, bem cedinho, bem escondidinha, os dolares dela. Ficamos ofendidos e o Fernando mandou ela passear. Alta e magra, deu um belo fantasma nessa foto.


Manoel Bandeira e Eugênio Montale: Poética semelhança

March 7, 2010
Foto: Sandro Alves

 

 

O senso comum tende a considerar muitas releituras de obras ou apropriações como plágio. Tom Zé dessacralizou bastante estes estigmas com sua Estética do plágio ou do Arrastão.

Tendo em mente que no caso da poesia esses casos de semelhanças entre uma obra e outra são ainda mais complexo, apresento aqui uma descoberta que fiz em fim dos anos 90:

Eugênio Montale & Manoel Bandeira
(Céticas semelhanças)

Momento num Café

Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.
Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta

Veja se você, leitor perspicaz, consegue ver a considerável semelhança que existe entre o poema acima, de Manoel Bandeira, e o que vai abaixo, de Eugênio Montale:

Forse un mattino andando in un’aria di vetro…

Talvez uma manhã andando em ar de vidro,
árido, voltando-me, verei cumprir-se o milagre:
o nada a minhas costas, o vazio detrás
de mim, com um terror de ébrio.

Depois, como num quadro, acamparão de chofre
árvores casas colinas, para o engano costumeiro.
Mas eis que será tarde: e eu andarei mudo,
entre os homens que não se voltam, com meu segredo.

O que há de semelhante entre os dois poemas? Mais de uma semelhança existe ai:

Os dois poemas tratam de indivíduos que têm uma visão diferente da dos demais relativamente à questão da existência, da natureza finita e “abismática” da existência. Manuel Bandeira trata explicitamente da finitude da vida, da condição material do humano. O personagem de seu poema é um cético e não crê em vida depois da morte. Motale, por sua vez, não particulariza a origem do nada na figura da materialidade do corpo e da morte.

O personagem em primeira pessoa do poema de Montale personagem também é o único a perceber uma certa condição, é o único a se voltar para trás e ver o terror de ébrio.

Nos dois poemas existe um indivíduo que se destingue dos demais por conseguir perceber algo relativo à existência que os demais não percebem.

Nos dois poemas existe um momento de suspensão do espaço tempo:

Banderia: “Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente”

Montale: “Talvez uma manhã andando em ar de vidro,
árido”

Não creio que seja forçar a barra ver uma semelhança entre o “gesto longo e demorado” e o “ar de vidro”.

 

Foto: Sandro Alves

 

Nos dois poemas temos o caso de um personagem que encontra a condição de ser o único por entre os “outros” que percebe a condição de traição da vida, de terror da existência. Ambos seguem, saudando a matéria liberta para sempre da alma extinta por entre aqueles que não se voltam.

“A vida é traição, ou “será tarde”. Ar de vidro ou gesto longo. Homens que não percebem o momento da passagem da morte no caixão ou aqueles que não se voltam.

É incrível, na minha opinião, a semelhança entre os dois poemas. Quanto mais os leio mais ela se me apresenta. Me falta, entretanto, tempo para alongar o discurso a esse respeito; devo voltar-me para os meus temas urgentes (maquinalmente sem me voltar muito para trás, nessa deliciosa odisséia entre-poemas ).

Sandro Alves


A linha esquecida

March 5, 2010

Detalhe de colagem de Mário Pacheco (Foto: Sandro Alves)

A linha do gol nuca foi a linha de meta

Uma curva, um zique ou uma seta

A porta do vizinho não é uma oferta

E certamento você não tem dons de profeta

Proteja-te a ti mesmo

Observe sempre a vida

Pela porta da sala ou pelos fundos

Você pode acabar encontrando saída

Uma blusa, uma luva, uma calça antiga

Os olhos tão longes daquela menina

Uma curva, uma reta, linha perdida

ponto, pronta, ponta esquerda distraída

Paralelas ou setas em grandes avenidas

Os sonhos de suceço

Calças velhas

Canções e poemas paralelos

Meninas perdidas no tempo

Menino esquecido de si

Amor próprio lento.


Sombras e obras

March 4, 2010

Foto:  Sandro Alves

contar histórias
descontar memórias
fazer rir
ou fazer fazer
mo mínimo
fica tudo em si
mesmo assim
falo também de mim
afinal se não tenho uma sombra
nunca terei
um lugar ao sol
no meio de tanta caverna escura
digo que faço uma sobra
porque ela é o que digo
tudo se estica
transcorre sem rumo
histórias, redundâncias
o fazer rir
no mínimo
fica tudo
assim mesmo
o que digo
não singulariza nada
são sinônimos infiéis
o seu mundo
pro meu
só é mudo
mesmo assim
insisto em falar da sombra
por que é o que eu digo.

A história da crise de apendicite no shopping com alguns retoques posteriores

January 22, 2010
Foto: Sandro Alves

Separei em parágrafos a postagem escrita diretamente sobre a senhora que sentia muita dor no shopping. Consertei umas coisinhas e tal, mas mantive lá embaixo, lá no dia do acontecimento (na verdade na madrugada, já no outro dia só que fui postar) a postagem original, sem nenhuma alteração. Ela é como uma fotografia, um documento do que passei. Abaixo o leitor confere essa versão primeira:

http://ssalvess.wordpress.com/2010/01/11/a-morte-por-perto-hoje-no-shopping-bulevard/

. Posto agora novamente com um pouco mais de capricho por apresso ao capricho e ao afeto que ele é para com o leitor. Ai vai a nova versão:

O texto abaixo foi copiado direto de uma postagem + um comentário feitos agora há pouco no Facebook:

Uma senhora clamava pela morte, sentia muita dor. Ouvi atrás de mim no banco do Shopping, eram 4 horas da tarde. Eu demorei para conseguir agir, segurar a mão dela e conversar. No começo achei que era fingimento. Os funcionários do shopping ,exceto um, ficavam olhando de longe com medo. Outras pessoas? Ninguém. A morte mete medo, a dor mete medo, é o medo virtual maior.

Eu comecei a convencê-la de que era uma crise renal e contar que eu já tinha passado por aquilo. Uma vitrine separa a pessoa do mundo nessa hora, solidão e medo. Ela se acalmou mas a dor era grande. Um pouco antes do filho dela chegar descobri que era apendicite. Pois uma vez pensei estar com apendicite e o médico me explicou os sintomas. Eu perguntei a ela se a dor começou ali, onde doia, no rumo do rim. Ela apontou o centro do abdomem. A dor da apendicite caminha, vai do centro superior até o canto inferior direito do abdomem. Então eu tive que falar para ela e explicar que era importante ela dizer ao médico onde tinha começado a dor. Falei isso duas vezes ao filho dela que estava em uma espécie de transe. Da segunda vez ele me agradeceu nervoso e foi com ela na cadeira de rodas para o carro. Espero que essa senhora esteja viva, apendicite não deve matar muito hoje em dia.

Na mesma hora, me contou um funcionário do cinema do shopping, uma criança de 12 anos passava mal dentro do cinema. Não cheguei a sentir muito medo, mas perguntei logo se era homem ou mulher. Eu disse graças a Deus quando ele respondeu que era uma menina. O que eu disse? Graças a Deus porque uma criança passa mal? Bom, meu filho estava assistindo “Avatar” nessa hora e tem quase 12 anos (Foto dessa postagem).

Ontem Joel Macedo falou uma coisa que já ouvi por escrito de Cláudio Cesar Dias Baptista: eu sou Deus. Só que o Joel é Deus de uma forma que eu sabia que somos pela educaçao Católica: o Espírito Santo está em nós. Acabou agora há pouco um episódio de Cold Case. A música final de hoje (o bom desse seriado são as músicas que encerram cada episódio) perguntava sobre qual seria o nome de Deus, depois perguntava “e se ele for um desastrado como um de nós”. Eu disse graças a Deus porque era uma menina que passava mal, desastrado, eu sei que sou.

Estou sem sono e precisando ver filmes na TV; “Imagética Ilha”. VHS ou DVD me deprimem; não tem ninguém do lado de lá rodando os filmes, não está no ar; eu posso parar o tempo com um controle remoto, isso me desanima e não gosto de ver filmes sozinho em DVD.  Na verdade poder parar o tempo com um controle remoto quando estou sozinho me leva à angústia, sentimento de vacuidade da existência. Nem sempre, mas muitas vezes.

Quando eu era pequeno meu pai colocava um radinho de pilha em baixo do travesseiro para eu dormir com o meu medo, o meu Deus e a sensação de companhia que a tecnologia propicia: “Sonifera ilha … num radinho, de pilha …” Os olhos dela, da senhora do shopping, nos meus e eu mantive a calma e contei um pouco do que senti quando pensei que ia morrer durante a crise de renal. Ela perguntava: é meu filho? Meu filho! Berrava: Me arranja um médico pelo amor de Deus!

Parei de ver TV por essa madrugada agora. Só filmes com muito sangue e tragédia. Que fome de desespero tem a humanidade. Flusser explica que Heideger e Sartre sacaram a vacuidade da existência, mas que só Cammus entendeu o absurdo dessa vacuidade. Eu quero e vou fazendo como posso um mundo com menos dor e medo para cada um de nós. Nessa história você poderia muito bem ser um dos sentidos.

S.alves!


A morte por perto hoje no shopping Boulevard

January 11, 2010
Foto: Sandro Alves

O texto abaixo foi copiado direto de uma postagem + um comentário feitos agora há pouco no Facebook:

Uma senhora clamava pela morte, sentia muita dor. Ouvi atrás de mim no banco do Shopping, eram 4 horas da tarde. Eu demorei para conseguir agir, segurar a mão dela e conversar. No começo achei que era fingimento. Os funcionários do shopping ,exceto um, ficavam olhando de longe com medo. Outras pessoas? Ninguém. A morte mete medo, a dor mete medo, é o medo virtual maior.

Eu comecei a convencê-la de que era uma crise renal e contar que eu já tinha passado por aquilo. Uma vitrine separa a pessoa do mundo nessa hora, solidão e medo. Ela se acalmou mas a dor era grande. Um pouco antes do filho dela chegar descobri que era apendicite. Pois uma vez pensei estar com apendicite e o médico me explicou os sintomas. Eu perguntei a ela se a dor começou ali, onde doia, no rumo do rim. Ela apontou o centro do abdomem. A dor da apendicite caminha, vai do centro superior até o canto inferior direito do abdomem. Então eu tive que falar para ela e explicar que era importante ela dizer ao médico onde tinha começado a dor. Falei isso duas vezes ao filho dela que estava em uma espécie de transe. Da segunda vez ele me agradeceu nervoso e foi com ela na cadeira de rodas para o carro. Espero que essa senhora esteja viva, apendicite não deve matar muito hoje em dia. Na mesma hora, me contou um funcionário do cinema do shopping, uma criança de 12 anos passava mal dentro do cinema. Não cheguei a sentir muito medo, mas perguntei logo se era homem ou mulher. Eu disse graças a Deus quando ele respondeu que era uma menina. O que eu disse? Bom, meu filho estava assistindo “Avatar” nessa hora. Ontem Joel Macedo falou uma coisa que já ouvi por escrito de Cláudio Cesar Dias Baptista: eu sou Deus. Só que o Joel é Deus de uma forma que eu sabia que somos pela educaçao Católica: o Espírito Santo está em nós. Acabou agora há pouco um episódio de Cold Case. A música final de hoje perguntava sobre qual seria o nome de Deus, depois perguntava “e se ele for um desastrado como um de nós”. Eu disse graças a Deus porque era uma menina que passava mal, desastrado, eu sei que sou. Estou sem sono e precisando ver filmes na TV. “Imagética Ilha”. VHS ou DVD me deprimem; não tem ninguém do lado de lá rodando os filmes, não está no ar; eu posso parar o tempo com um controle remoto, isso me desanima e não gosto de ver filmes sozinho em DVD. Nem sempre, mas muitas vezes. Quando eu era pequeno meu pai colocava um radinho de pilha em baixo do travesseiro para eu dormir com o meu medo, o meu Deus e a sensação de companhia que a tecnologia propicia: “Sonifera ilha … num radinho, de pilha …” Os olhos dela nos meus e eu mantive a calma e contei um pouco do que senti quando pensei que ia morrer durante a crise de apendicite. Ela perguntava: é meu filho? Meu filho! Berrava: Me arranja um médico pelo amor de Deus! Parei de ver TV. Só filme com muito sangue e tragédia. Que fome de desespero tem a humanidade. Flusser explica que Heideger e Sartre sacaram a vacuidade da existência, mas que só Cammus entendeu o absurdo dessa vacuidade. Eu quero e vou fazendo como posso um mundo com menos dor e medo para cada um de nós. Nessa história você poderia muito bem ser um dos sentidos.

S.alves!


Construir sobre rocha

January 10, 2010
Foto: Sandro Alves

Construir sobre a rocha do coração. Pretendo que seja uma edificação sem paredes brancas. Junto os aprendizados de dois mestres:  as palavras de Joel Macedo e as cores de Bebel Franco.  Rochas rosas como corações em cirandas, constelações de hippyes e ciber-punks. Meu Deus! Porque eu? Porque esse ponto de vista tão privilegiado? Ver o homem que foi hippye de verdade e que é um homem hoje foi muito bom. Ter conhecido uma moça pós punk que nasceu com as cores n’alma foi outro privilégio.

Tem aquele outro personagem que nunca esquece os amigos, apesar das mais pesadas intempéries. Esse são tantos. Eu devo aprender mesmo a construir sem paredes brancas, minimiza-las ao menos. A adolescente do colégio com 43 estava tão menina, jovem, linda.

Tudo começa com aquela menina que era antropóloga mas que escrevia atrás do cartão de visita no início dos 90: “Aquela que quer ser cineasta”. Aquela que é cineasta hoje. Cineasta, mulher bela, amiga. Ela sabia que não deveríamos levar as luzes para gravar o vídeo do escritor.

E eu? Eu até que consegui deixar o escritor falar.

Ainda apareceu aquele filho da grande música, mestre dela também. Rapaz que pensa e se move por entre as linguagens: agora também faz cinema. O mais respeitado documentarista da nossa cidade também se fez presente. Ativo, movimento! Muito movimento no cineasta; cinema. Eu não sei o que pode ser uma noite dessas se não for construir sobre rocha quando se faz no coração. Foi isso que disse o escritor, isso também.

A compreensão é uma história na qual poderia muito bem caber você.

!SalveS!